quinta-feira, 26 de junho de 2014

Santo António (Costa) ou Santo Costa

Os media portugueses não aprenderam com o erro de “casting” que foi a promoção de um político bem-falante e que passa bem nos media (José Sócrates), mas que, em pouco anos, levou Portugal à beira da bancarrota. Por isso, estão a repetir o erro: há anos que andam a “canonizar” António Costa e agora estão a apoiar a campanha dele para chegar ao poder no PS e no Governo.
A campanha dos media a favor de Costa é sofisticada e tem duas vertentes:
1 – Os media dão-lhe todo o espaço que ele queira para se afirmar, de acordo com a agenda dele. No topo do apoio está a participação na “Quadratura do Círculo”, com a oportunidade semanal de defender as posições em que ele se sente forte; seguem-se as entrevistas simpáticas. Depois, as peças noticiosas sobre Costa são factuais ou em tom positivo. Costa trata de só se expor publicamente em situações simpáticas: comemorações, inaugurações, discursos políticos.
2 – Os jornalistas e editores não lhe colocam questões difíceis (como pedir-lhe que escolha só entre opções más) e omitem ou desvalorizam tudo o que o possa manchar. Por exemplo, poucos associarão Costa às longas greves do lixo ocorridas em Lisboa no fim de 2013: ele não aparecia, os jornalistas não o procuravam e o assunto era tratado pelos media numa base factual e com algum desfavor para os trabalhadores – até o director-geral de Saúde veio recomendar aos lisboetas que não colocassem lixo na rua; sobre a causa nada disse. Poucos jornalistas colocaram esta questão aos comentadores; e poucos destes escolhiam opinar sobre o tema. Desafio os meus leitores a darem exemplos de casos em que, em situação comparável, os media não tenham perseguido e pressionado os políticos responsáveis para resolverem a situação com brevidade; e em que a maioria dos comentadores tenha sido acrítica da situação. Já durante as Festas de Lisboa de 2014, mais problemas com acumulação de lixo nas ruas só conseguiram garantir que algum vereador desse a cara às câmaras, acusando os serviços municipais de negligência – Costa, nem vê-lo. De novo, desafio os meus leitores a darem exemplos de casos em que os media se contentariam com isto e não perseguiriam o presidente da autarquia responsável até ele fazer alguma coisa ou reconhecer a sua responsabilidade. E a respeito dos ataques pessoais e de violência física entre os apoiantes de Seguro e de Costa, e da contestação a Costa no PS, alguém consegue saber dos factos com algum pormenor pelos media e sem recorrer às redes sociais? E quando noticiaram, praticaram, como com outros políticos, a repetição em numerosos noticiários e ao longo de dias (“martelar”)? E em que meio de comunicação já algum dos meus leitores viu algum jornalista ou comentador a referir que Costa é um “jotinha”? E quantos noticiam quantos mandatos concluiu Costa?
Assim têm os media construído um santo. Esta prenda dos media dá muito jeito a Costa, que se calhar nem ousaria desejá-la, quanto mais pedi-la.
Desafio os meus leitores a indicarem mais exemplos do tratamento favorável, sobretudo por omissão do que é desfavorável, que os media dão a Costa (como deram a Sócrates e não dão a mais ninguém).
 
Talvez com surpresa, os media estão a descobrir que há contestação a Costa dentro do PS. Mas continuam a tentar limitar, ou compensar, todos os elementos que prejudicam a imagem de Costa.
Assim, que político partidário em campanha podia esperar que as TVs e os comentadores ignorassem um artigo demolidor de Vasco Pulido Valente (http://www.publico.pt/politica/noticia/o-vacuo-1659832)? Ou o manifesto de militantes socialistas, que equipara Costa a Sócrates? Mas deram grande destaque a um manifesto de outros quatro militantes, cuja defesa da urgência serve Costa objectivamente.
Costa veio há dias dizer que há uma terceira via (outra...) para o país, que não passa pelos aumentos de impostos nem pelas reduções de despesa: o crescimento económico. Que político partidário em campanha podia esperar que as TVs e os comentadores não “martelassem” o vazio desta afirmação, ainda mais vinda de um ex-ministro de um Governo que não conseguiu maiores taxas de crescimento do que as actuais? Ou que não “martelassem” a comparação com semelhante posição de Seguro há pouco mais de um ano? E não custava nada; mas só nas redes sociais foi denunciada a demagogia de tais posições (também por mim: http://proa-ao-mar.blogspot.pt/2013/04/a-alternativa.html#comment-form).
Como Seguro, Costa também descobriu “a alternativa” à política do actual Governo… O populismo e a demagogia de Seguro e de Costa (idênticos aos de Sócrates) correspondem ao modelo que A. Downs propôs em 1957: políticos que apenas buscam o poder para o saborearem, e não políticos para realizarem um projecto político. Mas é destes que Portugal necessita e os portugueses anseiam.
 
Costa tem as qualidades que o tornam atraente para os media: fala bem, é persuasivo, tem boa presença nas TVs, parece maduro e experiente. Aos media não interessa a substância do que fez e do que faz, nem das políticas que defende; bastam os anúncios e a imagem (construída por alguém); e que estas passem. Os media acham que o estilo e a imagem de Costa é melhor para ganhar eleições do que a de Seguro; só por isso o canonizam.
Costa e os seus apoiantes sabem disto e, racionalmente tentam aproveitar a oportunidade que lhes caiu no regaço. Sugerem que os adversários políticos temem Costa, justamente porque ele pode conseguir uma maioria absoluta. Nisso têm razão.
 
Mas o sentido do medo é este: Costa é o regresso aos défices e endividamento descontrolados (leia-se: despesismo) e à política de culpar os outros pelo que corre mal (leia-se: irresponsabilidade) a que Sócrates nos habituou. E o despesismo e a irresponsabilidade são praticados por alguns, beneficiam muito alguns, mas acabam sempre por ter de ser pagos por todos. Para a larga maioria da população, as relações benefícios/custos do despesismo e da irresponsabilidade são más; mas é a maioria que leva os políticos despesistas e irresponsáveis ao poder, com a absurda fé de que se falam bem governarão bem; isto é, se são bons na tribuna, devem ser bons a decidir as questões colectivas – o que tem uma coisa a ver com a outra?
Seria de esperar que o sofrimento causado pelas políticas que nos afastaram da bancarrota tivesse feito a maioria perceber que é de evitar repetir as políticas que nos levaram à beira da bancarrota; porque aí chegados, para de lá sair, só com sofrimento. Mas cada vez há mais sinais de políticos e eleitores (não só na faixa do PCP e do BE, dos quais não se espera outra coisa) que pensam que já se pode voltar a aumentar as despesas públicas; o sinal mais claro e frequente é a vontade de não querer pagar a dívida (ainda por cima, quando antes defendiam mais despesas e investimento públicos, e endividamento; e achavam que o endividamento das PPP e as rendas do sector energético não eram problema – até tinham vantagens para estimular o crescimento… e reduzir o endividamento externo…). O que sugere que não perceberam a crise que sofreram e que, a fazer-se o que desejam, podemos todos voltar a sofrer (talvez em menor grau) de novo e a curto prazo.
 
Por isso, é um desígnio nacional derrotar Costa e Seguro. Para isso, é necessário fazer sentir ao povo que votar neles – em graus diferentes, mas não muito diferentes – conduz à mudança, sim, mas a mudança para o que de errado e mau se fazia até 2011. O controlo internacional apertado impedirá que Portugal volte a chegar à beira da bancarrota; mas não impedirá que haja desvios perigosos, na sequência dos quais ocorram pressões externas para “voltar ao bom caminho”, através de políticas recessivas e contra-cíclicas (leia-se: políticas duras e sofrimento). Estas oscilações, de que só usufruem alguns, ainda que suportados por uma maioria absoluta nas próximas eleições, acabarão por condenar todo o país a uma década ou mais de estagnação, a acrescentar ao período perdido de 2001-2013.
 
É difícil convencer socialistas (que se distribuem por todos os partidos, como Hayek explicou em 1944) que o futuro do país está em perigo se o Estado fizer despesas acima dos impostos que os cidadãos toleram pagar – socialismo é, por definição, intervenção e despesas do Estado – e que os défices são sempre pagos, mais tarde ou mais cedo, pelos impostos. Mas já era tempo de, pelo menos, a maioria dos socialistas (de todos os partidos) e dos portugueses perceberem que enquanto houver défice e se não querem pagar mais impostos, então terão de aceitar cortes nas despesas, e que é irresponsável pretender que não. Provavelmente, só uma derrota de Costa e Seguro vai forçar o PS a perceber que tem de mudar, mas no sentido da responsabilidade e do controlo das despesas públicas, até porque há muito espaço para poder diferenciar-se substantivamente do PSD e do CDS-PP.
E também era tempo de os portugueses fazerem sentir aos políticos que a derrota eleitoral deve implicar o seu afastamento da vida política, e a duração desse afastamento deve ser um múltiplo do ciclo eleitoral proporcional aos fracassos que tiveram e aos custos que causaram ao país. Com o fim das subvenções vitalícias ficámos obrigados a aguentar com políticos fracassados no activo, porque não têm emprego, ou fonte de rendimento, alternativos fora da política.
 
Mas temos de começar a regenerar a política por algum lado, e começar por derrotar Costa e Seguro, e fazer-lhes sentir que estão a mais, é um bom princípio para regenerar os partidos e o sistema político, porque actua sobre as pessoas, o activo fundamental do sistema. Só depende de o povo realmente querer mudar.

4 comentários:

  1. Metes-te em tudo. Não no que sabes, mas sobretudo naquilo que te encomendam.

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  2. Convinha só não ignorar que, numa altura em que a dívida pública até estava próxima do limite fixado, foram instruções da União Europeia que incentivaram os governos a gastar (o tal despesismo do Estado tão caro aos socialistas), como forma de tentar conbater a crise (estávamos em 2008)...
    Há anos que somos, de facto, governados pelo eixo. Tudo o resto são tretas...

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  3. Os santos nunca são conhecidos pelos apelidos, Não há santo Assis, nem São Loyola, apenas.

    E em português de lei, mesmo que fossem conhecidos pelos apelidos e não pelo nome próprio eventualmente seguido pelo apelido, seria sempre São Costa e nunca Santo Costa. se o nome começa por consoante, o Santo passa a São. Veja-se, São João, São Marcos, São Lucas, São Mateus, São Pedro, São Paulo.

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