segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

CEM MIL REALMENTE POBRES

Numa coisa concordo com Pacheco Pereira: o debate político está muito pobre em Portugal. Mas ao contrário do que ele diz, o Facebook dá uma boa imagem desse debate; pode não entusiasmar, mas é elucidativa. Pacheco Pereira também não melhora o debate, pois parece estar emocionalmente empenhado em “ajustar contas” com os que o “minaram” quando ele apoiava Manuela Ferreira Leite. Fraquezas da carne, claro, mas que não melhoram nada de nada.

Como bem disse João Salgueiro, a situação de Portugal é a de um país que saiu de uma guerra derrotado; os edifícios de pé enganam os desinformados. Por isso, o que se espera é que fervilhem iniciativas, ideias e debates para melhorar e mudar o que não funcionou; mas o que preenche os media e as redes sociais é que “vamos pelo caminho da Grécia”, “tem de se pedir a renegociação da dívida”, ou “há austeridade a mais” – era tudo isto que queriam ouvir hoje a Paul Krugman, e não ouviram! Aprenderão?

Esta narrativa tem tido pouco êxito, apesar de os seus promotores fazerem tudo para preencher as redes sociais, o espaço mediático e “a rua”. Talvez por estar cheia de contradições: os que eram contra instrumentos típicos do capitalismo, como o crédito, agora são seus grandes defensores; os que defendiam a estatização, agora defendem os empresários; os que se opunham ao crescimento capitalista, agora exigem-no, e são arautos de Keynes, cujas teses visavam defender o capitalismo nos 1930s. Quando as medidas a tomar agora são imperativas é realmente difícil propor alternativas, que se aproveitem do descontentamento popular e não os derrotem já em eleições futuras.
Esta narrativa está também cheia de “autoridades”: pessoas que nunca geriram uma empresa (terão trabalhado nalguma?) criticam gestores e empresários; pessoas que nunca estudaram economia criticam as medidas macroeconómicas; pessoas que não conhecem o processo de integração europeia falam do futuro da Europa…

Se isto representasse o país, seria realmente mau. Mas representará cem mil pessoas, que estão nos media e nas redes sociais; a quem não esteja atento, pode parecer que aquilo é o país – é 10% dos 10% que representam no país. Vêm para dizer o que acham, tantas vezes, com escassa espessura argumentativa (o tão portuguesinho “achismo”, incentivado pelos que vivem para os coros de protestos organizados pelos activistas do costume, ou por coros de monólogos emotivos e surdos).

De facto, o crescimento das exportações, a decepcionante adesão dos portugueses às greves e às manifestações da CGTP, PCP e BE (não, não encheram o Terreiro de Paço! E se tivessem enchido, não passavam de 100 mil, e não as 300 mil que a propaganda diz) e a conduta e os diálogos das pessoas por todo o lado mostram que milhões estão incomodados e em retracção, mas sabem porquê e para quê. Não estão à espera de um político para gerir as suas “expectativas”. Haverá cem mil portugueses que precisam de alguém que os guie, que lhes eleve a auto-estima e que lhes resolva os seus problemas – são esses os que se sentiram atingidos pela palavra “piegas”, são os verdadeiros pobres e estão na bancarrota; mas há milhões que estão a procurar melhorar a sua vida e, de caminho, a situação do país; não confiam nos políticos, mas confiam que tudo se há-de resolver, como 800 anos de História mostram.

Claro que o Sebastianismo tão-português está vivo nas palavras: um português não deixará de se lamentar sempre que haja alguém que pareça poder ouvir ou dispensar “uma atençãozinha”; mas se não houver, ou quando se dão conta que não vai vir um aumento, um subsídio ou um mercado cativo, tratam da sua vida como podem e como fazem no estrangeiro.

Sem comentários:

Enviar um comentário