Em Julho de 2011,
elaborei e enviei para publicação nos Anais do Clube Militar Naval um artigo sobre a “Marinha de duplo uso”, como comentário a um artigo também publicado
nos Anais, que a defendia. O meu artigo foi censurado pela Comissão de Redacção dos Anais. Fica aqui o registo do
processo, tal como eu o conheço e interpreto.
No meu artigo, opus-me ao
“duplo uso”, uma “vaca sagrada” da Administração da Marinha há uma meia-dúzia
de anos. Por ser uma questão sensível, mandei ao director dos Anais um email
para criar um canal de comunicação informal e direto, que evitasse situações públicas desagradáveis. O director dos Anais nunca
me respondeu.
Em Set-2011, constando haver
dificuldades na publicação do artigo nos Anais, o “Diário de Notícias”
convidou-me a publicar um resumo do artigo.
Em 15-Out-2011, o diretor
dos Anais informou-me por email que o artigo foi recusado por estar disponível
na minha página pessoal na Internet, o que violaria o requisito editorial de
ser inédito. O texto disponível na minha página pessoal não era exactamente
igual ao que mandei para os Anais, pois entretanto corrigi dois erros. Não deixava
de ser inédito por isso; muitos autores disponibilizam na Internet textos submetidos
para publicação, para divulgação e comentários. Eu contestei esta decisão
editorial dos Anais, e ela foi revogada.
Em 09-Mai-2012, o director
dos Anais informou-me por email que o artigo “não foi considerado para
publicação”. As razões da censura aparecem numa forma que tenta
emular a apreciação de artigos científicos entre pares (peer review), o que não
se ajusta a um artigo de opinião num país livre. O director dos Anais rejeitou então a
livre crítica sobre o “duplo uso” e sobre a Administração da Marinha, e assumiu
a defesa de ambos. Ao fazê-lo, colocou-se na posição de avaliador das minhas opiniões,
enquanto me apontava falta de isenção…
Em 25-Mai-2012, respondi
por email ao director dos Anais, contestando o acto de censura; ele não me
respondeu nem alterou a sua decisão.
Em 28-Mai-2012, um amigo convidou-me a publicar o
artigo no seu blogue, Estado Sentido, onde ele foi comentado por pessoas interessadas no debate, algumas oficiais da Marinha.
Lamento que o blog “A Voz da Abita” se
tenha decidido alhear deste acto de censura nos Anais, matéria que deve
interessar aos oficiais da Marinha, sócios do Clube Militar Naval (cuja
tradição de abertura e discussão livre é centenária) e membros do dito blog
(que tem sido um útil instrumento de divulgação e esclarecimento).
Em 05-Jun-2012, num post no
blog “Água Aberta no Oceano” dizia-se que o “Diário de Notícias tem desenvolvido
uma campanha antipática para a Marinha”; que “ataca a Marinha através de
notícias e, por vezes, não notícias”; concluía dizendo “Tempos houve em que
estes fenómenos tinham a ver com avenças pagas a jornalistas, mas penso que
atualmente isso já não seja possível”. Escrevi um email ao autor do post, por
me sentir visado (comentei notícias e os meus artigos não são notícias pelo que
são “não-notícias”) e recusando a insinuação de ser pago por qualquer
“campanha”; o autor informou-me por email (que não me inclino a divulgar) que não
publicava o meu texto nos comentários ao post. Lamento esta opção de não dar
voz a quem é visado por comentários antipáticos.
Em 27-Nov-2012 foi
lançado o nº23 da revista “Segurança e Defesa”, no qual foi publicado, no
essencial, o artigo em causa (pp.42-47). Ironicamente, o subdiretor desta revista é o
titular do cargo de Sub-Chefe do Estado-Maior da Armada.
Em suma, este ato de
censura nos Anais suscitou o interesse de um jornal diário de referência,
ajudou o Governo a criar legislação que invalida o “duplo uso” e clarifica as
fronteiras entre a Marinha e a Autoridade Marítima, e levou o artigo à estampa
numa revista de maior audiência e prestígio do que os Anais.
Haverá quem ache
que estes resultados foram um mal menor; eu concluo que o debate é saudável e que a censura não compensa.
Nunca vi tamanha distorção da realidade e a mais despudorada e egocêntrica autoavaliação.
ResponderEliminarCompreende-se o incómodo - explica o anonimato e a ausência de uma lista de factos e interpretações disputadas, que se poderão contrastar com os documentos que sustentam as minhas afirmações. Ao menos devo presumir que não é um militar a falar, porque a cobardia do anonimato é incompatível com o carácter militar.
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